Pensar é preciso/XII/Enxugamento do Estado: sistema unicameral e proporção representativa equânime

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Enxugamento do Estado: sistema unicameral e proporção representativa equânime.

O Senado da República, além de inútil, é uma instituição nociva ao país, sendo um exemplo de que, como afirmou Fernando Pessoa, “a administração do Estado é o pior de todos os sistemas imagináveis”. Por experiência universal, a máquina pública deve ser enxugada ao máximo, reduzindo suas funções à garantia da ordem e da justiça social, além de cuidar da educação e saúde pública. Outras atividades devem ser deixadas a cargo de empresas privadas, cabendo ao Estado apenas o monitoramento e a supervisão.

Para fazer leis que regulamentem a vida do cidadão, por que há necessidade de duas Câmaras, a dos Deputados e a dos Senadores, a não ser para uma atrapalhar a outra e levar anos para um decreto ser publicado? Como andam as coisas agora, um projeto de lei tem que passar por um processo absurdo, chegando ao fim com os legisladores cansados e a matéria obsoleta: uma proposta tem que ser protocolada, analisada sobre sua conveniência, levada para uma Comissão que escolhe um relator. Este emite um parecer, que deve ser apreciado pela Câmara. Se aprovado, o projeto inicia uma caminhada não menos tortuosa no âmbito do Senado. Se houver alguma ementa, o processo volta para a Câmara e começa tudo de novo! Não seria mais funcional, além de mais econômico, simplesmente extinguir o Senado e ainda reduzir o número dos Deputados?

Se a quantidade de Deputados Federais fosse garantia do progresso de um Estado ou região, o Norte, Nordeste e Centro-Oeste do Brasil seriam as regiões mais desenvolvidas, pois, proporcionalmente, se beneficiam de um maior número de representantes no Congresso Nacional. Enquanto o Estado de Roraima tem 01 deputado para cada 50 mil habitantes, São Paulo tem 01 para cada 570 mil. Quer dizer, politicamente, um paulista vale onze vezes menos do que um cidadão que vive no Norte do país. Talvez essa seja a causa principal da enorme disparidade econômica entre as várias regiões do Brasil: onde há mais políticos, maior é o atraso, pois aumenta a roubalheira!

A atual representação do povo brasileiro na Câmara dos Deputados é uma das causas fundamentais do nosso governo clientelista, que gerou um atraso secular nas instituições políticas. A Constituição de 1988, ao estabelecer um número mínimo (oito deputados) e máximo (70) para cada Estado, incentivou a criação de novos Estados, aumentando desnecessariamente as despesas públicas. Em países realmente progressistas, o número de deputados federais, além de ser menor (os EUA têm apenas 435, contra os 513 do Brasil, embora nossa Confederação tenha menos eleitores), é proporcional ao número dos habitantes. O justo, portanto, seria que cada Estado brasileiro tivesse um percentual de deputados federais correspondente ao número de seus eleitores. Não teria chegada a hora de acabar com tamanha distorção? Afinal, não é a própria Constituição a pregar o princípio básico da isonomia, a igualdade de todos perante a lei? Isso é racional? Mesmo sendo legal, como uma norma injusta pode ser considerada ética?

O pior é que a imoralidade política acontece não só ao nível federal, mas se estende também no âmbito estadual e municipal. Criam-se prefeituras uma colada à outra, na mesma cidade. Metade de uma rua pertence a um município e outra metade a outra prefeitura, com impostos, taxas e normas burocráticas diferentes, levando à loucura os coitados dos contribuintes. Experimentei isso pessoalmente: contratado pela UFPE, fui morar no Recife e comprei um apartamento na praia da Piedade, continuação da Boa Viagem. Ao passar a escritura, descobri que eu não estava residindo na cidade do Recife, mas no município de Jaboatão dos Guararapes!

Separar cidades tem a única finalidade de criar novos cargos públicos em Câmaras ou Assembléias, com o fim de acomodar apadrinhados de políticos. Que saudade do tempo em que os vereadores prestavam seus serviços gratuitamente! A desculpa de que precisa pagar bem o funcionário público para evitar a corrupção cai por terra face à experiência de que os políticos melhor remunerados são os que mais roubam! Infelizmente, cada vez mais a atividade política está sendo vista como um modo fácil de ganhar dinheiro e de forma não sempre correta, que chega a ser imoral, embora seja “legal”.

Além de eliminar os senadores, deveria ser reduzido ao mínimo indispensável o número de deputados, vereadores, assessores, secretarias, ministérios, diretorias, repartições, comissões, presidências, lideranças etc. Atualmente, um deputado federal tem o direito de nomear uma vintena de “assessores”. Para fazer o quê? A função de vice de cargos executivos e de suplente dos legislativos é realmente necessária? Se, ocasionalmente, faltar o Presidente da República, seu substituto natural poderia ser o Presidente da Câmara dos Deputados, como acontece em outros países que dispensam a figura do “vice”. Não seria uma despesa a menos? Será que se um Senador, Deputado ou Vereador entrar de férias ou ficar impedido por outro motivo, seu substituto terá condições de inventar novas leis em tão pouco tempo? E que adianta criar tantas leis, se as que já existem (e são inúmeras!) não são postas em prática?

Eliminando os empregos parasitários e reduzindo as despesas com o serviço público, sobrariam mais verbas para a educação, a saúde, o transporte coletivo, a geração de trabalho produtivo. Há cidades com duas ou mais Prefeituras, cujas Câmaras de vereadores são apenas cabides de emprego. Se já se sustenta um corpo diplomático caríssimo (embaixadas, consulados, adidos culturais e comerciais) para cuidar dos negócios do Estado, por que o Presidente da Republica tem que se ausentar constantemente, levando caravanas em custosas viagens internacionais? É realmente necessário gastar dinheiro público com a manutenção de um superavião particular, quando a Presidência poderia usar aviões da FAB ou de carreira, como fazem tantos governantes de países bem mais ricos do que o nosso? Para que gastar tanto dinheiro com festas ou propaganda de empresas públicas? Órgãos governamentais não têm que competir com firmas particulares. Com o dinheiro que o Governo Federal, os Estados e as Prefeituras gastam na divulgação das obras que fazem (ou que apenas prometem fazer), poderiam ser feitas mais obras. O desperdício do dinheiro público é a maior afronta à miséria em que vive boa parte do povo brasileiro. Um dia iremos compreender que uma mais justa distribuição da riqueza do nosso país, mais do que uma questão ideológica ou moral, é um imperativo cívico visando eficiência, pois todos ganhariam com ela.

Tem-se falado muito sobre estatizar ou privatizar como se os dois processos fossem excludentes e não complementares. É necessário que o Governo, além de utilizar os recursos públicos provenientes dos impostos, pode e deve recorrer ao capital privado, nacional ou estrangeiro, sempre que for preciso. Acima de qualquer interesse econômico pontual, o Estado deve zelar pelo bem estar da totalidade do povo, ora privatizando empresas públicas deficitárias, ora intervindo nas empresas privadas que não estão atendendo satisfatoriamente às necessidades da sociedade. Vou dar dois exemplos para esclarecer o que penso a respeito:

A Telebrás, empresa de telefonia nacional, até poucos anos atrás, não estava dando conta do recado, sendo muito difícil conseguir uma linha telefônica, de valor tão alto que devia ser declarada na “Declaração de bens” anualmente apresentada à Receita Federal. O Governo brasileiro resolveu, então, privatizar a companhia telefônica, possibilitando a concorrência de firmas privadas, tendo como conseqüência a explosão da telefonia fixa e celular que, em poucos anos, barateou os preços e permitiu o uso do telefone também pelo povo mais humilde. Na contra face, a Varig, companhia aérea de capital privado, mas a única linha internacional com bandeira brasileira, foi à falência, prejudicando de uma forma incalculável, além dos funcionários que perderam o emprego, todos os brasileiros que por trabalho, saúde ou turismo precisam viajar para o exterior. As companhias internacionais, livres da concorrente brasileira, duplicaram o preço das passagens. E, até hoje, ninguém reclamou contra esta vergonha nacional: o Brasil, com quase 200 milhões de habitantes, tem que recorrer ao transporte aéreo de outros países que não têm nem um décimo de sua população! E o problema não é tecnológico, pois fabricamos e exportamos aviões! Não era o caso do Governo brasileiro intervir, nacionalizando a Varig e injetando dinheiro público para proteger seus cidadãos? O transporte coletivo não é obrigação do Estado? Como se pode ver, o Governo teria que intervir, hora para privatizar, hora para estatizar, conforme os interesses do povo. Por que nossos políticos e burocratas não agilizam o funcionamento do dispositivo legal das PPPs, as Parcerias Públicas Privadas, que permitem a colaboração do capital público com o privado, fazendo média entre a pouca eficiência da empresa pública e a ganância das firmas particulares?