Quatro regras de diplomacia/Appendice/IV

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§ IV
Escriptos de caracter mixto

Emanam occasionalmente das Embaixadas, communicações a diversas Authoridades nacionaes ou estrangeiras, e documentos de varia composição, dos quaes mencionaremos os principaes.

Officios. – Póde ser que uma Embaixada ou Legação tenha de manter correspondencia mais ou menos seguida com outras Repartições do Governo patrio, afóra a dos Negocios Estrangeiros; com os Consulados; com alguma das Missões nas outras Côrtes, etc.; ou pode ter que dirigir-se accidentalmente a qualquer Authoridade nacional. A fôrma d'estas communicações é a do Officio. Limitamo-nos pois a reproduzir o seguinte importante documento.


MODELO
N.º 39
Officio do Conde de Palmella e D. Joaquim Lobo da Silveira, Plenipotenciarios de Portugal no Congresso de Vienna, a Manuel Marques, Governador de Cayenna, a respeito da restituição da mesma Colonia

Ill.mo Sr.

Pelos ultimos Despachos que recebemos da Côrte do Rio de Janeiro, fomos informados de haver Sua Alteza Real o Principe Regente nosso Senhor sido servido ordenar a V. S.ª em Officio do Ex.mo Sr. Marquez de Aguiar, datado a 15 de Junho do presente anno, que em devida observancia das Convenções ajustadas em Vienna, ratificadas já por Sua Alteza Real, houvesse V. S.ª de restituir a colonia de Cayenna, com todas as formalidades praticadas em semelhantes casos, aos Commissarios francezes que ahi se apresentassem devidamente autorisados pelo Senhor Rei Luiz XVIII, com plenos poderes expedidos em data posterior áquella Real determinação: não podendo ainda então ter chegado ao conhecimento do Principe Regente nosso Senhor as ulteriores estipulações por nós ajustadas no Congresso de Vienna, relativamente a Guyanna Franceza, cuja restituição a Sua Magestade Christianissima deverá ser precedida, em virtude das referidas estipulações, de huma Convenção particular entre as duas Côrtes de Portugal e de França, como clara e evidentemente se mostra pelo artigo 107.º, inserto no Tratado geral do Congresso, e que he do teor seguinte:

«Sua Alteza Real o Principe Regente do Reino de Portugal e do Brazil, para manifestar de uma maneira incontestavel a Sua particular consideração para com Sua Magestade Christianissima, obriga-Se a restituir a Sua dita Magestade a Guyana Francesa até ao rio Oyapock, cuja embocadura está situada entre o quarto e quinto grau de latitude septentrional; limite que Portugal sempre considerou ser o que havia sido lixado pelo Tratado de Utrecht.

A epocha da entrega d'esta Colonia a Sua Magestade Christianissima será determinada, quando as circumstancias o permittirem, por uma Convenção particular entre as duas Côrtes; e proceder-se-ha amigavelmente, logo que ser possa, á fixação definitiva dos limites das Guyanas Portugueza e Franceza, conforme o sentido stricto do Artigo VIII do Tratado de Utrecht».

Julgâmos, pois, ser do nosso dever, tendo por huma parte em vista o serviço de Sua Alteza Real e os interesses da Sua Corôa, e pela outra a difficuldade das communicações entre o Rio de Janeiro e Cayenna, de pôr V. S.ª de accôrdo sobre este importante assumpto, recommendando-lhe mui particularmente de não proceder a entrega dessa colonia ao Commissario ou Commissarios francezes, que ahi hajam de se apresentar para esse effeito, antes de receber novas ordens do Principe Regente nosso Senhor, passadas já depois de haverem chegado ao seu Real conhecimento os sobreditos novos ajustes, ou na falta daquellas Reaes ordens, antes de V. S.ª receber as convenientes participações transmittidas por nós, ou pelo Embaixador, Ministro, ou Encarregado de Negocios da nossa Côrte, residente na de Paris, que certifiquem a V. S.ª de ter sido já concluída a Convenção particular acima mencionada, da qual essencialmente depende a restituição dessa colonia a Sua Magestade El-Rei Luiz XVIII.

Deus Guarde a V. S.ª muitos annos. Paris, 8 de Setembro de 1815.

Conde de Palmella.

D. Joaquim Lobo da Silveira.

Ill.mo Sr. Manuel Marques.


P. S. A recommendação que neste Officio fazemos a V. S.ª quanto em nós cabe, não he resultado de noticia que tenhamos da ida de algum Commissario francez para essa colonia; he puramente huma medida de prevenção, necessitada por se ignorar no Rio de Janeiro, na data de 15 de Junho do presente anno, o artigo por nós estipulado no Tratado geral do Congresso, acerca de Cayenna.

Conde de Palmella.

D. Joaquim Lobo da Silveira[1].


Circulares. — Depois de ter entregue a sua Credencial, o chefe de Missão, conforme o uso, participa o facto aos seus Collegas acreditados nas outras Côrtes, mencionando a data da entrega, pedindo-lhes a sua cooperação a bem do serviço, e offerccendo-lhes a sua, tanto para o serviço publico, como para o particular de cada um. Esta participação faz-se por uma Circular, de que nos parece escusado offerecer modelos. O mesmo diremos com relação a circulares aos Consulados, sobre negocios referentes ao serviço. É sempre a fórma de Officio que se observa na redacção tanto d'aquellas como d'estas ultimas, e bem assim na resposta às Circulares dos Collegas.

Ha tambem eventualidades em que ao Agente Diplomatico incumbe fazer alguma communicação extraordinaría aos outros chefes de Missão do paiz que representa, ou mesmo ao Corpo Diplomatico estrangeiro na Côrte onde reside. No primeiro caso a fórma é de Officio; no segundo de Nota.

Eis dous modelos.

MODELOS


N.º 40
Circular do Marquez de Palmella aos chefes de Missão Portuguezes nas outras Côrtes, participando-lhes a chegada da Senhora D. Maria II.

Ill.mo e Ex.mo (ou Ill.mo) Sr.

Com o maior jubilo participo a V. Ex.ª (ou V. S.ª) que hoje pelas nove horas da manhan entrou n'este porto a fragata Brasileira «Imperatriz», trazendo a seu bordo o precioso penhor da felicidade da Nação Portugueza; e devemos dar graças à Providencia Divina não só por ter chegado a salvamento a este Paiz a Senhora D. Maria II, mas tambem pela perfeita disposição de saude em que se acha esta Augusta Senhora, que encanta a todos que a vêem pela sua figura e aspecto senhoril, realmente superior a sua idade, unido ao mesmo tempo á vivacidade que é propria dos seus annos.

O enthusiasmo com que é aqui recebida excede a minha expectação. Sua Magestade dirige hoje mesmo a El-Rei de Inglaterra uma carta, de que remetto copia inclusa a V. Ex.ª Depois de amanhan partirá provavelmente d'esta cidade, dirigindo-se em direitura a Plymouth para dar aos Portuguezes, que ali se acham reunidos, a consolação, de que a sua lealdade os torna bem dignos, de contemplarem a Augusta Rainha, por cuja legitima causa estão fazendo tão extraordinarios sacrifícios.

Deus Guarde a V. Ex.ª Falmouth, 24 de Setembro de 1828.

Ill.mo e Ex.mo Sr........

Marquez de Palmella[2].

N.º 41
Circular do mesmo ao Corpo Diplomatico residente em Londres, ácerca da suspensão voluntaria das suas funcções diplomaticas como mandatario do Governo de Lisboa. (Traducção particular).

Londres, 26 de Maio de 1828.

O abaixo assignado, Embaixador Extraordinario e Plenipotenciario de Sua Magestade Fidelissima, tem a honra de remetter a Sua Excellencia o Sr. Principe de Polignac o documento aqui junto que julga do seu dever communicar-lhe.

O abaixo assignado, não podendo já reconhecer as tentativas que se praticam abertamente em Portugal contra os direitos legitimos de Sua Magestade Dom Pedro IV e dos seus Successores, conforme a Carta outorgada por este Monarcha à Nação Portugueza, teve necessariamente de recorrer ao Soberano que tem a honra de representar, por não poder cumprir outras ordens senão as suas, em uma vircumstancia tão extraordinaría como deploravel.

O abaixo assignado está persuadido que não faz senão seguir restrictamente a linha de conducta que lhe é imposta pelo dever, e ousa esperar que Sua Excellencia o Sr. Principe de Polignac será do mesmo modo de ver.

O abaixo assignado renova a Sua Excellencia a segurança da sua alta consideração.

Marquez de Palmella.

A Sua Excellencia o Sr. Principe de Polignac.
&.ª &.ª &.ª


N. B. Iguaes: Ao Principe de Esterhazy, Austria. — Ao Principe de Leeven, Russia. — Ao Sr. de Falck, Paízes Baixos. — Ao Barão de Bulow, Prussia. — Ao Conde de Munster, Hanover — Ao Conde de Moltke, Dinamarca. — Ao Visconde de Itabayana, Brazil. — Ao Conde de Alcudia, Hespanha. — Ao Conde de Mandelsohe, Wurtemberg. — Ao Barão de Cetto, Baviera. — Ao Barão de Nothomb, Suecia. — Ao Conde de Acqui, Sardenha — Ao Conde Ludolf, Napoles. — Ao Sr. de Biedermann, Saxonia — Ao Sr. Lawrence, Estados Unidos. — Ao Sr. Colquhoun, Villas Hanseaticas[3].


Instrucções. — Póde ser necessario ao chefe de Missão encarregar um seu subordinado de alguma commissão extraordinaria em serviço do Estado, caso que geralmente envolve a convenicncia de lhe dar instrucções por escripto.

MODELO


N.º 42
Instrucções do Marquez de Palmella, Embaixador em Londres, ao Secretario da Embaixada, José Balbino de Barbosa Araujo, por occasião de o mandar em commissão a França, com referencia a refugiados Portugueses arribados em Brest.

Londres, 20 de Fevereiro de 1829.

O objecto da expedição de V. S.ª a França é o evitar mais demoras e despesas pelo que toca aos refugiados Portuguezes que entraram arribados em Brest, para onde deverá proceder immediatamente que obtenha em Paris os esclarecimentos necessarios sobre as disposições do Governo Francez.

Por consequencia vai d'aqui direito a Paris, e por meio do Sr. Nuno Barbosa de Figueiredo fará chegar ás mãos do Ministro da Marinha de Sua Magestade Christianissima a carta de officio, que em data de hoje lhe enderecei.

O mesmo Sr. Nuno Barbosa deverá solicitar de Mr. Hyde de Neuville como do Ministro dos Negocios Estrangeiros de Sua Magestade Christianissima o consenso d'aquelle Monarcha, para que os emigrados Portuguezes possam com a maior brevidade tornar-se a pôr a caminho para a ilha Terceira, verificando o projecto que com tanta barbaridade, e em offensa do direito das gentes nos não foi permittido da primeira vez effectuar. Os cruzadores Britannicos já abandonaram aquellas paragens, mas devemos contar com certeza que se achará supprido o seu logar por vasos de guerra do partido rebelde; e como não seja compativel nem com os desejos de Sua Magestade Fidelissima, nem com a dignidade e generosidade de Sua Magestade o Rei de França expor estes desgraçados, que a sorte collocou debaixo da sua poderosa protecção, a cairem victimas indefezas nas mãos dos seus algozes, o unico meio que se apresenta para evitar tão grande infortunio, é o de se prestar um salvo-conducto a estes individuos, ou seja escoltando-os uma embarcação de guerra franceza, ou seja por uma declaração de Sua Magestade Christianissima, uma vez quis naveguem debaixo da protecção da bandeira Franceza.

Se esta, e as mais razões que nos meus precedentes officios á missão de Paris tenho suggerido, não produzirem o desejado effeito, resta então tratar de conseguir ao menos a certeza de que lhes não serão tolhidos os subsidios que o Governo Francez tão nobremente lhes tem subministrado, em quanto as circumstancias não permittirem, como presentemente não permittem, que elles sejam suppridos do mesmo modo que até agora o têem sido. Bem entendido que se deverá considerar a todo o tempo a Senhora D. Maria II como devedora á França por este acto de beneficencia.

N’esta segunda hypothese é indispensavel entender-se logo com o Governo Francez, sobretudo no que diz respeito á distribuição dos ditos individuos, sendo muito de desejar que ou fiquem juntos, ou separados por pequenas distancias, e que se não siga o exemplo, dado por Inglaterra, de querer separar os omciaes dos soldados. É outrosim preciso que haja alguma explicação sobre a auctoridade que os chefes e superiores d'este corpo devem continuar a exercer, emanada da Senhora D. Maria II, para o que muito bom seria que houvesse um individuo nomeado pelo Encarregado de Negocios de Paris, por exemplo o Consul Bernardo Daupias, para receber os subsídios do Governo Francez, e distribuil-os, a fim de que sempre estejam em contacto com os Agentes da mesma Senhora.

Finalmente é essencial obter a certeza que se não impedirá a todo o tempo a saída d’esses individuos desarmados para qualquer parte que pretendam dirigir-se, comtanto que não seja para ir commetter um acto de aggressão.

Ohtidas estas clarezas, que deve ser o mais promptamente possivel, para não ter em suspenso a sorte de tanta gente, passará V. S.ª logo a Brest, onde apresentará ao General Saldanha a carta de que vai munido. No caso do Governo Francez haver annuido ao primeiro pedido, tratará da promptificação de transportes ou navios francezes para a viagem à ilha Terceira, tendo em vista a brevidade, a economia, e a commodidade dos passageiros.

No caso de que não possa ter logar o primeiro pedido, mas sim o segundo, cuidará do desembarque dos refugiados, cuja distribuição em terra ficara a cargo do seu commandante, e sómente deverá V. S.ª tomar conta das provisões e mais objectos pertencentes à Fazenda, dispondo d'elles se tiverem valor attendivel, ou distribuindo-os pelos emigrados, e despedindo os transportes.

No caso extremo de não ser possivel obter nem o primeiro nem o segundo pedido, só resta o recurso de emprehender, sem perda de tempo, a viagem para o Rio de Janeiro; e para esse tim deverà V. S.ª fazer as compras de mantimentos necessarios, e fretar mais um transporte, alem dos quatro que já existem, vistas as representações que a esse respeito téem sido dirigidas a Sua Magestade Fidelissima.

Repito que em qualquer dos tres casos, a solução deve ser promptissima, visto que a urgencia das circumstancias não permitte que se attenda a nenhuma consideração secundaria.

Para as suas despezas em Brest sacará letras em virtude da carta de credito que leva.

Occorre-me, no caso de ficarem os refugiados em França, que não seria difficil aggregar-lhes os offciaes Portuguezes que lá estão, e nos Paizes Baixos, por isso que se dão a seu respeito os mesmos motivos de hospitalidade por parte da França, e da falta de meios por parte de Sua Magestade Fidelissima.

Estas instrucções deverão ser communicadas ao Sr. Nuno Barbosa para que, pela parte que lhe toca, cumpra as ordens de Sua Magestade, que n'ellas se contém.

Marquez de Palmella[4].


Avisos publicos. — Quando, por qualquer motivo, o chefe de Missão tem de dirigir-se publicamente aos subditos da sua Nação que se acharem no paiz da residencia, o costume hoje é servir-se da imprensa para fazer o aviso ou annuncio. Antigamente os meios de publicidade eram outros. Offerecemos o seguinte exemplo.

MODELO


N.º 43
Edital que o Ministro Portuguez mandou affixar na igreja de Santo Antonio dos Portuguezes em Roma, por occasião do rompimento de relações com a Curia.

Francisco d'Almada Mendonça, do Conselho de Sua Magestade Fidelissima, e seu Ministro Plenipotenciario junto à Santa Séde Apostolica, etc.

Faço saber a todos os Vassallos d'El-Rey Nosso Senhor, que havendo Sua Magestade visto ha muitos tempos com exemplarissima constancia por huma serie de factos decisivos inteiramente obstruidos pelo Ministerio Politico da Curia de Roma os orgãos por onde as instancias da mesma Magestade Fidelissima se procuraram conduzir ao conhecimento de Sua Santidade, sem que a experiencia de tantas e tam repetidas condescendencias successivamente desaproveitadas lhe permitta ha tempos alguma esperança de poder dirigir as suas obsequiosas supplicas á presença do Santíssimo Padre: E vendo que a extraordinaria, escandalosa e nunca vista animosidade do mesmo Ministerio passou ao excesso de declarar hum rompimento á mesma Magestade Fidelissima: Por não ser nestas indecorosas circumstancias possivel, sem que o mesmo Monarca haja de conservar em Roma hum Ministro publico, e hum numero de Vassallos honrados e fieis, só para serem testemunhas dos insultos, que contra a sua Authoridade Regia, e contra o Decoro Pontificio tem accumulado, e vai accrescentando de palavra e por escripto cada vez mais livremente o sobredito Ministerio Politico, o os declarados e notorios sequazes que tem aggregado ao seu partido com escandalo universal de toda a Europa; foi Sua dita Magestade Fidelissima urgentemente forçado a mandar logo sahir com o sobredito seu Ministro Plenipotenciario os mais Vassallos da sua Coróa, e os que como taes comem Beneficios ecclesiasticos nos seus Reinos e Dominios, de huma Côrte, onde sem poderem fazer serviço algum ao Santissimo Padre, aggravam em cada hora mais com a sua presença os dezares da Regia Authoridade que Sua dita Magestade Fidelissima não pode deixar de conservar tam illeza, e tam independente no temporal como lha transmittiram os seus Augustus Predecessores, sem se fazer responsavel não só a Deus, e á mesma Igreja Catholica, de que he, e se presará sempre de ser devotissimo filho, e exemplarissimo defensor, mas tambem a todos os outros Monarcas do Universo. Ordena tambem Sua Magestade Fidelissima que todos os seus Vassallos se apresentem no dia 3 pelas 21 de Italia ao dito seu Ministro Plenipotenciario a elleito de poder fazer de todas as referidas pessoas huma exacta relação. Para que esta Real, e indispensavel Resolução de Sua Magestade chegue á noticia de todos os sobreditos Vassallos fiz fazer o presente Edital, que por mim assignado será anexado no Real Hospital de Santo Antonio, para que em tempo nenhum possão alegar ignorancia etc.

Dado no Palacio da minha residencia aos 2 de Julho de 1760.

Francisco d'Almada Mendonça.

Por ordem do mesmo Senhor

P. Antonio José Rodrigues[5].


Protestos. — Actos e documentos d'esta ordem podem ser motivados por circumstancías previstas eventualmente nas Instrucções dadas ao Agente pelo Governo patrio. Neste caso são authorisados, ou feitos em obediencia de ordens superiores. Casos ha porém em que seria dever do Agente protestar de motu proprio (N.º 44). Póde o Protesto, conforme as circumstancias, constar de um documento sobre si (N.º 45), ou meramente de uma clausula em documento tratando do assumpto (N.º 46).


MODELOS


N.º 44
Extracto de um auto a que procedeu o Juiz de Paz de serviço junto do Ministro da Policia de França, no qual foi inseriu o Protesto dictado, a 22 Pluviose, anno 6.º (10 de Fevereiro de 1798), por Antonio de Araujo de Azevedo, Ministro de Portugal em missão especial, quando se quiz proceder à abertura dos seus papeis. Azevedo assignou sómente a 24, data do encerramento do processo. (Traducção do Francez).

O ...... disse que, estando revestido de caracter publico na Republica Batava, e tendo igualmente o caracter do Ministro plenipotenciario para a negociação da paz entre a Côrte de Portugal e a Republica Franceza, devia reclamar a salvaguarda do direito das gentes a respeito de qualquer acto de violencia contra si; que a sua qualidade de Ministro publico na Hollanda bastaria para poder comparar a sua situação à do cidadão Semonville, e para lhe dar o direito de fazer reclamações de natureza identica ás que esse embaixador tinha direito de fazer perante a Côrte de Vienna. Accrescentou que os Ministros publicos, assim como tudo o que respeita ás suas missões, devem ser inviolaveis, ainda depois de uma ruptura de guerra, excepto quando uma Potencia se ve obrigada a empregar represalias, para fazer suspender qualquer violencia anteriormente commettida contra a pessoa do seu embaixador; que sem a observancia d'essa inviolabilidade poderia no dia seguinte ao de uma declaração de guerra proceder-se contra um embaixador, e comprometter a segurança que deve existir nas negociações. Que tendo-se permittido a Mr. de las Casas, embaixador de Hespanha em Londres, e ao Barão van Haetten, Ministro de llollanda em Vienna, que licassem n'essas duas Côrtes, apesar da ruptura de guerra entre ambas as Potencias, não poderiam em virtude do direito das gentes ser atacados ou perseguidos por nenhum acto emanado das auctoridades d'esses paizes; que em consequencia de tudo isto e não havendo commettido nenhum crime que o prive das suas prerogativas e immunidades, deve protestar, como protesta do modo mais positivo contra a abertura e leitura dos seus papeis, porque a considera como violação manifesta dos principios do direito das gentes, que são dictados pela mutua utilidade das nações e consagrados pela razão.

O .... disse além d'isto que, sabendo que o sr. Marquez del Campo, embaixador de Sua Magestade Catholica, recebeu ordem da sua Côrte de fazer as mais instantes reclamações sobre este negocio, segundo os mesmos principios do direito das gentes, deve pedir e pede que esse embaixador de uma Potencia amiga e alliada das duas nações seja informado de tudo o que se passa a este respeito, e se ache presente a este acto de abertura, assim como ao exame e leitura dos seus papeis, se todavia se pretender effectual-o; declarou mais que se consente em deixar abrir e rubricar os seus papeis, é sómente por ter de ceder á força, como lhe cedeu quando foi levado perante o cidadão Ministro da policia geral, e quando foi preso e conduzido á Torre do Templo. Pelo mesmo motivo de não poder resistir, consentiu na apprehensão e imposição dos sellos nos seus papeis; mas considera este procedimento como acto de violencia; e não havendo assignado os anteriores processos verbaes, por não lhe terem sido acceitos os seus protestos, declarou que não assignará o presente auto senão por estar n'elle inserto este protesto[6].

N.º 45
Protesto do Barão da Torre de Moncorvo, em forma de Nota para o Secretario d'Estado Britannico, contra os actos da Commissão Britannico-Brazileira relativos ao exame de navios trazendo a bandeira Portuguesa. (Traducção do Francez).

Tendo o Governo Portuguez sido informado pelo Encarregado de Negocios de Sua Magestade Fidelissima no Rio de Janeiro de que o Governo Brazileiro, cedendo às instancias do Encarregado de Negocios de Sua Magestade Britannica na mesma Côrte, expedira em 19 da Outubro de 1838 uma ordem aos Commissarios Brazileiros da Commissão Britannico-Brazileira, pela qual se lhes determina que examinem, segundo a Convenção de 23 de Novembro de 1826 entre a Inglaterra e o Brazil, todos os navios que trouxerem bandeira Portuguesa, excepto os fabricados nas Possessões Portuguezas antes do Decreto de 16 de Janeiro de 1837, que nunca tenham trazido essa bandeira, assim como os navios a vapor comprados no espaço de tres annos contados da data d'esse Decreto, pertencentes a Brazileiros ou a subditos Portuguezes residentes no Brazil, os quaes navios seriam apresados, tendo a bordo escravos da costa de Africa;

Considerando o Governo Portuguez este procedimento do Governo Brazileiro como um ataque á independencia da Nação Portuguesa, visto que Portugal não interveiu n'essa Convenção, nem acquiesceu a ella, ordenou immediatamente ao Encarregado de Negocios de Sua Magestade Fidelissima no Rio de Janeiro que protestasse formalmente contra esse acto do Governo Brazileiro, por illegal e contrario ao Direito das Gentes.

O abaixo assignado, Enviado Extraordinario e Ministro Plenipotenciario de Sua Magestade Fidelissima junto de Sua Magestade Britannica, acaba tambem de receber ordem da sua Côrte para dirigir a S. Ex.ª o Sr. Visconde Palmerston, Principal Secretario d'Estado de Sua Magestade Britannica na Repartição dos Negocios Estrangeiros, um Protesto baseado não só nos mesmos motivos que o dirigido ao Governo Brazileiro, mas alem d'isso na letra e espirito da Convenção de 28 de Julho de 1817 entre Portugal e a Gran-Bretanha, segundo a qual é prohibido visitar e capturar ao sul do Equador os navios que trouxerem bandeira Portugueza e navegarem conforme as leis estabelecidas em Portugal.

Por todos estes motivos, conformando-se o abaixo assignado as ordens que recebeu da sua Côrte, protesta em nome do seu Governo contra todos os actos da Commissão Britannico-Brazileira contrarios aos Tratados existentes, e offensivos da dignidade da Corôa de Sua Magestade Fidelissima e da independencia da Nação Portugueza, e pede a S. Ex.ª o Sr. Visconde Palmerston queira levar este Protesto ao alto conhecimento de Sua Magestade Britannica, sua Augusta Soberana.

O abaixo assignado pede a S. Ex.ª o Sr. Visconde Palmerston queira acceitar a certeza da sua elevada consideração.

Londres, 30 de Agosto de 1839.

O Barão da Torre de Moncorvo.

A Sua Excellencia o Sr. Visconde Palmerston[7]
&.ª &.ª &.ª

N.º 46
Protesto do Conselheiro Joaquim Cesar de Figanière e Morão, Ministro de Portugal nos Estados Unidos, constante do remate da sua Nota datada de Philadelphia a 13 de Outubro de 1843, e dirigida ao Secretario d'Estado da referida Republica. (Traducção particular).
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Com quanto tenha a satisfação de ver que sois da opinião que ha pouca duvida de que o assumpto será em breve submettido ao Congresso, havendo toda a razão de esperar e de anticipar que será resolvido em termos satisfactorios a Portugal, seria faltar ao meu dever se, no entretanto, deixasse de protestar do modo o mais formal, como ora faço, em nome e proveito do meu Governo, contra a interpretação do Tratado de 26 de Agosto de 1840, entre Portugal e os Estados Unidos, pela qual este Governo possa attribuir-se o direito de impor maiores ou outros direitos sobre os vinhos de Portugal e suas Possessões, do que aquelles que são impostos sobre vinhos de outras Nações[8].

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Protocollos. — São instrumentos em que se consignam de um modo succinto, mas claro, exacto e preciso, os actos de conferencias, incluindo o essencial de quanto se passou e se disse. Têem caracter official, e levam as assignaturas dos conferentes. De ordinario o assumpto dos Protocollos refere-se às conferencias em Congresso de Plenipotenciarios; ou as havidas no decurso das negociações de uma Convenção ou de um Tratado.

Mas afora estas, ha outras occasiões em que é necessario authenticar um acto por meio de um Protocollo; como, por exemplo, uma troca de ratificações, uma conferencia para a escolha de um Arbitro, ou para decidir uma pendencia, ou assentar em commum um modo de acção relativamente a um negocio em que duas ou mais Potencias estejam interessadas[9]. A esta ordem pertence o seguinte documento.

MODELO


N.º 47


Protocollo da conferencia tida em Londres, em 12 de janeiro de 1828, pelo Ministro Britannico, os Embaixadores Austriacos e os Plenipotenciarios por parte do Senhor Infante Dom Miguel, sobre o emprestimo de 200,000 libras sterlinas contratadas pelo Governo Portngnez em Londres, continuação da estada em Portugal das tropas Britannicas, e relativamente á abdicação da Coroa Portugneza pelo Senhor Dom Pedro IV. (É traducção do Francez.)


Protocollo da conferencia tida em Londres em 12 de Janeiro de 1828
PRESENTES
por parte da Inglaterra:

Sua Excellencia o Conde de Dudley, Principal Secretario d'Estado de Sua Magestade Britannica na Repartição dos Negocios Estrangeiros.

por parte da Austria

Sua Alteza o Principe Esterhazy, Embaixador de Sua Magestade Imperíal e Real Apostolica junto á Côrte de Londres.

Sua Excellencia o Conde de Bombelles, Enviado Extraordinario e Ministro Plenipotonciario de Sua Magestade Imperial e Real Apostolica junto á Côrte de Lisboa.

por parte de Portugal:

Sua Excellencia o Conde de Villa Real, Par do Reino de Portugal.

Sua Excellencia o Marquez de Palmella, Par do Reino de Portugal, e Embaixador Extraordinario e Plenipotenciario de Sua Magestade Fidelissima junto à Côrte de Londres.

Desejando o Governo Britannica evitar os embaraços, que para Sua Alteza Real o Infante Dom Miguel resultariam da falta de fundos disponiveis nos primeiros dias da sua Regencia, consente em prestar seus bons officios para facilitar um emprestimo contratado em Londres pelo Governo Portuguez até a quantia de 2002000 libras sterlinas.

Lord Dudley declara em nome do seu Governo o desejo de que as tropas Britannicas possam voltar quanto antes de Portugal, visto que inteiramente está preenchido o fim que ambos os Governos se propozeram quando o de Portugal reclamou a ida d'estas tropas, em virtude dos Tratados existentes entre as duas Coroas.

O Conde de Villa Real e o Marquez de Palmella, tendo sido auctorisados por Sua Alteza Real o Infante Dom Miguel a assistir á presente conferencia, respondem em nome de Sua Alteza Real que a opinião d'este Principe está perfeitamente de accordo a esse respeito com a do Governo Britannico; sómente Sua Alteza Real deseja que a epocha do embarque d'estas tropas, ainda que proximo, não seja definitivamente fixado antes que Sua Alteza Real, á sua chegada a Portugal, tenha expressado os votos, que a este respeito lhe cumprir enunciar.

O Principe Esterhazy, Embaixador de Sua Magestade Imperial e Real Apostolica junto a esta Côrte, e o Conde de Bombelles, Seu Enviado Extraordinario e Ministro Plenipotenciario na de Lisboa, que assistem a presente conferencia por pedido do Governo Britannico e de Sua Alteza Real o Infante Dom Miguel, não podem deixar de applaudir completamente a tudo o que acaba de ser enunciado por Sua Excellencia Lord Dudley, bem como pelos Plenipotenciarios Portuguezes.

Lord Dudley, o Principe Esterhazy e o Conde de Bombelles julgam dever enunciar de novo, conformemente ao que já foi consignado nas conferencias de Vienna, os votos de seus respectivos Governos, para que a abdicação da Corôa de Portugal por Sua Magestade Dom Pedro IV seja completada quanto mais depressa possivel, e sem restricção.

Completada a abdicação, e confirmada a separação, as duas Côrtes se obrigam a prestar seus bons officios a fim de que os Governos de Portugal e do Brazil se accordem entre si para communicar este arranjo a todas as Potencias, e obter o reconhecimento d'ellas.

As duas Côrtes se obrigam igualmente a prestar os seus bons officios, afm de regular definitivamente, por um Tratado, a ordem de successão nos dois ramos da casa de Bragança, concluída a qual transacção será levada ao conhecimento das Potencías estrangeiras para ser reconhecida por ellas.

Dudley. Villa Real.
Esterhazy. Palmella[10].
Bombelles.


  1. Sr. Biker, Suppl. T. XVI p. 591. A Convenção de que se trata, entre Portugal e França, foi celebrada em 28 de Agosto de 1817; vide Visconde de Borges de Castro, Coll. de Tratados, etc. T. V p. 423.
  2. Sr. Reis e Vasconcellos, Despachos do Duque de Palmella, T. IV p. 182.
  3. O original francez, nos Despachos, etc., do Duque de Palmella, T. III p. 526. — Ás vezes a Circular é de natureza a não ser dirigida a todos os Ministros Estrangeiros; veja-se, como exemplo, a Nota Circular do Barão da Torre do Moncorvo para os Representantes das Potencias assignatarias dos Tratados celebrados no Congresso do Vienna, residentes na Côrte de Londres, datada do 27 de Nov. de 1839, e impressa a pag. 582 do T. XXVIII do Supplemento do Sr. Biker.
  4. Despachos e Corr. do Duque de Palmella, T. IV pag. 387.
  5. Sr. Biker, Suppl., T. XI P. I p. 62. — Vejam-se tambem o Contra-edital, e ainda outro Edital; ibid. pp. 64 e 66.
  6. Sr. Biker, Suppl. T. XII p. 203. — A pag. 207 acha-se um segundo Protesto do mesmo Antonio de Araujo de Azevedo.
  7. Sr. Biker, Suppl., T. XXVIII pag. 449.
  8. Acha-se o original inglez no — American State Papers a pp. 22—24 do Executive Doc. 41, da 1.ª Sessão do 28.º Congresso, (Casa dos Representativos) pub. em 1844. — Como outro exemplo de protesto, citaremos o que foi passado em Londres, aos 24 de setembro de 1644, pelo Ministro Residente de Portugal, Antonio de Sousa de Macedo, contra a ordem do Parlamento Britannico prohibindo a entrada de navios do partido realista, sob pena de confisco, etc. Veja-se a nossa obra: Catalogo dos Manuscriptos Portuguezes existentes no Museu Britannico (Lisboa, 1853, 83.vo), a pag. 170; ou, o Quadro Elem etc. T. XVII pag. 53.
  9. O documento por onde se authentica uma troca de ratificações, chama-se tambem Acto ou Termo; ha até exemplo de se designar Acto Reversal (Visconde de Borges de Castro, Coll. de Trat. T. III p. 199). — Cartas Reversaes são propriamente uma declaração, em virtude da qual um Soberano ou uma Nação se compromette eventualmente a observar o que esta estabelecido, não obstante o acto que deu motivo, para qualquer fim, a ser-lhe exigida a declaração ou reversal; ou são passadas para resalvar os direitos de outrem quando semelhante acto os podesse prejudicar; ou finalmente como promessa, concessão ou compromisso de caracter eventual. A «eventualidade» é pois de essencia em taes documentos. É uma especie aliás de rara occorrencia. Ha, porém, artigos de Tratado, e respectivas declarações annexas, que participam da essencia de actos reversaes. — A «Declaração ao do Embaixador de Portugal, datada de Paris a 10 de fevereiro de 1763, relativamente á alternativa da assignatura, por ensejo da accessão de Portugal ao Tratado de Paz da mesma data, entre Hespanha, França e Inglaterra, é virtualmente uma Carta Reversal (Veja-se este documento, bem como a «Contra-declaração» do Gabinete Francez, no Quadro Elemen.., T. VII p. 84).
  10. Sr. Visconde de Borges de Castro, Coll. de Tratados, T. VI p. 67. O texto original francez acha-se tambem nos Despachos do Duque de Palmella, T. III p. 434.— Vejam-se, para as Conferencias de Vienna de 18, 20 e 23 de outubro de 1827, pp. 21, 49 e 59 do citado volume da Coll. de Trat. Encontram-se outros Protocollos na mesma Collecção; e designadamente, T. V pp. 56 e 243, T. VI pp. 550 e 640, T. VII pp. 202, 212, 242, 322 e 330.