O Livro de Esopo/O villão que vae com o asno á feira
[E]ste poeta nos dá este emxemplo e diz que hũu vilãao trazia hũu asno com ssua cárregua de mercadaria pera vender na feyra, e dizia ao asno que andasse agynha. Este asno com perfia nom queria andar e dizia:
— Antes quero que me mates, que viuer comtiguo em tanto trabalho: ca /[Fl. 31-v.] cada dia leuo cárrega, e tu ssenpre me vaas ferindo de tras; cada dia me ameaças e cada dia me feres. Por çerto eu nom quero padeçer tamto mall e tanta vergomça! Amtes quero morrer!
Ho senhor lhe deu tamtas paamcadas, que o matou. E esfolou-ho e uendeo o coyro.
Pom este poeta emxemplo pera nos amostrar, e diz que nós nom deuemos deseiar a morte per tribulaçom que ajamos, porque ho homem cree a auer avantagem por rreçeber morte, e ell pejora, porque, depoys que o homem morrer, comem-ho os vermẽes, e a alma outrossy sse vay ao Inferno, e pejora, ca muyto peor pena he aquela do Inferno que a pena d’este mundo; sse a alma vay em parayso, e o corpo rreçebe marteyro por o de Deus[1], a alma está benta; mays o corpo sse torna terra. Porem toda cousa sse deue padeçer por nom padeçer morte.
Notas
[editar]- ↑ No original está a nota: «Isto é: por o marteyro (=martírio) de Deus.». Na Secção Corrigenda e Addenda o autor altera a nota para: «Isto é: por causa de Deus».