O Reino de Kiato/Capítulo 3
O susto havia passado, a vida voltado a bordo, mas sem os encantos dos primeiros dias.
O jornal suspendera a publicação por falta de noticias. Foi o que mais sentiram os passageiros. Acostumados a ler pela manhã as novas dos factos mais importantes que se passavam em todo o mundo, não se conformavam com semelhante situação.
A’ noite os salões ficavam desertos.
Todos viviam mais ou menos aprehensivos. Não sabiam para onde os levaria a sorte, nem que tempo duraria a derrota.
Uma manhã luminosa e serena, avistou-se terra. Muito longe, no horizonte appareceu um quasi imperceptivel ponto negro, que foi crescendo á medida que o navio se aproximava.
— Terra á vista!.. E a alegre nova se espalhou em instantes pelo vapor inteiro.
O transatlantico ia se arrastando com uma miseravel marcha, o que estava em desaccordo com a pressa que os passageiros tinham de chegar.
A manhã escura foi crescendo, illuminando-se. Já se delineava a perspectiva de um porto com os seus navios.
Os passageiros, debruçados na amurada, olhavam pelos binoculos, pretendendo ver telhados e chaminés de fabricas. O commandante ignorava em que porto ia fundear.
Aquella terra não figurava no mappa-mundi. Os passageiros inquiriam em que terra iam aportar; o capitão calava-se.
O navio cortava agora as aguas quietas da vasta bahia. A cidade estava de todo á vista. Via-se a silhueta da casaria, divulgava-se o vermelho dos telhados e as torres das igrejas.
O navio aproximou-se do caes e arreou o ferro. No topo do mastro grande, tremulava havia minutos o pavilhão inglez.
Passou-se o resto do dia, chegou a noite e a terra não se communicou com o vapor. Extranho caso!
Acostumados a receberem as visitas da saude e da alfandega ao entrarem nos portos, achavam exquisita semelhante infração ás leis geraes.
Mas, ás primeiras horas do dia seguinte, viram um escaler cortando as aguas rumo do transatlantico. A embarcação atracou. Os passageiros, apinhados nas amuradas, tinham os olhares nos tripulantes. Eram estes o homem do leme, o do motor electrico e mais duas personagens.
Os recemvindos causaram estupefacção ao pessoal do vapor, que pasmou deante da figura daquelles homens altos, tão altos que mediam mais de dois metros, e que, atravez de uma vigorosa carnação, denunciada na fresca e rosada côr da pelle, exhibiam a mais perfeita saude.
Arreada a escada, subiram. Um dos visitantes dirigiu em inglez a palavra ao commandante: era o representante da Saude Publica. Indagou do estado sanitario a bordo, se havia alguma pessoa doente de molestia contagiosa. Obtendo resposta negativa, deu por findo o inquerito.
Chegou a vez do outro visitante, o agente do governador da cidade, o qual se limitou a entregar ao commandante alguns exemplares de um manifesto dos poderes publicos do reino de Kiato, escripto em diversas linguas.
Depois retiraram-se, permittindo o desembarque dos passageiros, com a condição de serem observadas com todo rigor, as leis do Reino, expressas no manifesto entregue.
O commandante leu o seguinte:
«A todos que aportarem ao reino de Kiato faço saber que: — sendo prohibida a fabricação do alcool e de liquidos que o contenham, como o maior factor que é da degeneração physica, e perversão moral do genero humano, é condemnado á morte todo aquelle que infringir essa lei humana e sabia;
os que desembarcarem em estado de embriaguez, offendendo a sã moral dos habitantes do Reino, dando um exemplo pessimo de sua corrupção, serão presos e enviados ao navio de que são passageiros e este intimado a deixar o porto dentro de duas horas;
prohibido o plantio e, ipso-facto, a manipulação e o uso de fumo, causa que é de graves desordens organicas que encurtam a vida, serão presos e deportados os que clandestinamente procurarem restaurar o uso e o plantio do fumo em Kiato;
é prohibido o desembarque em todos os portos do Reino aos doentes de molestias contagiosas».
Ao dr. Paterson coube um exemplar do manifesto. A figura mascula dos homens que haviam visitado o navio e agora os dizeres do edito despertaram nelle a curiosidade de ver aquella terra em que se havia solucionado o maior problema social — a extincção do alcoolismo.
Paterson era um emerito bebedor e um inveterado fumante; mas, mesmo assim, não podia deixar de admirar a grande conquista em prol da saude, da moral da humanidade. Queria ver como viviam as gentes, que se haviam libertado do jugo do maior dos tyranos, que envenena cinco gerações successivas. Queria ver o povo que teve a suprema ventura de exterminar de seu seio o maior dos matadores.
Disposto a sacrificar o whisky e o tabaco por alguns dias, desembarcou.
|s suas surprezas começaram no caes.
O escaler atracou em uma escada de largos degraos de marmore negro. Subiu-a. Chegando ao patamar, aproximou-se-lhe um homem que lhe pareceu agente do poder publico. Trajava roupas leves de brim e não trazia insignias de autoridade. Era um latagão de mais de dois metros de altura, espadaudo, thorax largo, côr rosea, physionomia-alegre. Saudou o dr. Paterson em francez, e, como este tivesse correspondido ao cumprimento em inglez, pediu nesta lingua que lhe desse o nome, profissão, idade, naturalidade, e destino, pois ficaria sob as vistas da policia. Satisfeitas as exigencias do agente, Paterson seguiu rua afóra.
Era original tudo quanto ia vendo. As ruas eram todas de construcções elegantes, isoladas por jardins. De mil em mil metros uma praça arborisada de plantas que se conservavam vestidas todo o anno e, nos claros, canteiros de todos os feitios, emmoldurados por uma grama de folhinhas meudas, cujas nervuras pareciam de ouro. Dentro das molduras verde-gaio, formando losangos, quadrilateros, trapezios, cresciam rosas, jacynthos, lyrios, tulipas, de um vigor, frescura e perfume em tudo differentes do que até então tinha visto em outras partes do mundo. Paterson parou, impressionado pelas cores vivas das corollas e pelo suavissimo perfume que dellas se evolava. Havia ali flores qne não conhecia.
O viço dos vegetaes estava de perfeito accordo com o vigor dos homens.
Uma roseira, sobretudo, prendia a sua attenção. Era uma rosacea, anã, de longos aculeos curvos e acerados, foliolos pequenos, com o limbo luzente, como prateado.
A flor era exquisita e curiosa. Tinha corolla de um sem numero de petalas azul ferrete, quasi negro, como que brunidas, com reflexos metallicos, e no centro os orgãos de reproducção, alvos como arminho; engastava-se num pedunculo curto, envolvida num ambiente de delicado e subtil perfume.
Seus olhos não se cansavam de mirar aquella belleza, quando viram outra belleza suspensa de um galho da roseira.
Era uma crysallida, uma joia que resplendia aos raios do sol.
Quiz apossar-se della, mas conteve-se; seria um crime de prisão ou de degredo. Contentou-se com se aproximar quanto poude e de perto apreciar aquella maravilha da natureza. Embevecido ficou quando viu que a tunica que envolvia a nympha, em seu somno de crysallida, era uma joia de subido valor, como artista algum havia imaginado.
O corpo era de ouro, a cabeça de platina e o dorso tinha, engastado em cada articulo, um rubi espinela.
Paterson havia visto crysallidas de um sem numero de variedades de borboletas, mas nenhuma egual a esta.
Amando a natureza com os seus apurados sentidos de artista, com uma solida cultura de Historia Natural, visitava a crysallida todas as manhãs, cada vez mais enamorado de sua belleza.
Uma manhã, qual não foi a sua decepção, quando encontrou vasio o sudario que amortalhára a nympha, mas um sudario como feito de escuro pergaminho sem reflexo metalico, sem uma joia, semelhante a uma escara de ulcera.
No chão, uma pequena borboleta côr de chocolate, feia, se arrastava, com as azas ainda humidas, esperando que seccassem para voar.
Paterson soube mais tarde que essa rosa se chamava rainha de Kiato.
Farto o antigo herbanario de apreciar tantos specimens curiosos, seguiu rua a fóra.
Andava e parava, estupefacto com as maravilhas que seus olhos iam vendo. Tudo ali era differente e superior ás outras agremiações humanas que conhecia.
Os transeuntes que ia encontrando obrigava-os a parar para contemplal-os — exemplares perfeitos de virilidade, de força, de saude. O seu trajar era modesto e de perfeito accordo com os preceitos da hygiene.
A vestimenta das mulheres, que em todos os paizes pecca pelo exagero, pelo descaso da saude, pela infracção ás leis do pudor, da decencia mesmo, ali era moldada nos mais sãos principios da hygiene e da moral.
Bellas mulheres, mais bellas do que as inglezas quando bellas e novas. Que elegancia no porte, que modestia no vestir!... Nellas não havia os artificios da moda: apresentavam-se como eram. As faces coradas não de arrebique, mas do carmim da saude. A vida via-se nellas espocar por todos os poros da carnação sadia. O busto conservava-se erecto, em perfeita elegancia, não obedecendo o porte á constricção do espartilho, cujo uso havia sido condemnado como nocivo á saude. Quem o usasse pagaria pesada multa e, na reincidencia, a pena de prisão por cinco annos.
Paterson olhava a estatura das mulheres, fóra do commum, se bem que muito de accordo com a dos homens, e reparou o calçado. Grande foi a sua admiração quando as viu, senhoras solteiras e casadas, usando sapatos de tacão baixo como o dos homens. Este uso havia sido imposto por uma lei que punia com grande multa o sapateiro que fizesse calçado de tacão alto.
Aquellas mulheres tinham a graça natural do sexo, graça sem affectação, sem coquetismo. As louras eram louras; não mudavam a côr dos cabellos pelo artificio.
Paterson, depois de ter caminhado algum tempo, notou que a edificação se modificava, que havia soberbos edificios, sobrados de dois, tres e quatro andares, predios de architectura antiga, uma cidade velha cercada pela cidade nova. As habitações não eram isoladas nem ajardinadas. Era a capital do Reino no tempo da decadencia, quando o uso do alcool ainda não havia sido abolido.
O dia estava alto. Paterson procurou um hotel. Estrangeiro, pediu informações ao primeiro transeunte que encontrou. Com muita attenção e cortezia, offereceu-se este a acompanhal-o á hospedaria unica que havia no lugar.
Seguiram e pouco tiveram que caminhar para se achar em frente do hotel, um predio de construcção antiga, mas de fachada limpa, como se tivesse sido edificado ha pouco tempo.
Paterson agradeceu a gentileza do cicerone e subiu a escadaria do sobrado. Achou-se em breve na sala de espera do primeiro andar, um compartimento pouco espaçoso, de aceio rigoroso, bem mobiliado: ao centro, uma mesa coberta de marmore, sobre a qual um livro; ao lado, uma escrivania. As paredes eram núas, á excepção de uma em que estava suspenso um quadro com estes dizeres:
CODIGO DO HOTEL
Aquele que se abrigar aqui estará em perfeita segurança, não só a sua pessoa como os seus haveres garantidos pelas leis as mais sabias do mundo.
Exige-se que o hospede cumpra os seus deveres e respeite os direitos dos outros.
O uso do alcool é aqui prohibido, sob pena de morte e tambem o do fumo, sob pena de expulsão do Reino.
O hotel fecha-se ás 10 horas da noite.
Antes de annunciar-se, leia a tabella de preços, condições, e caso acceite inscreva-se no livro que tem á vista: nome, idade, naturalidade, profissão, o navio em que aportou, data e destino.
Depois, sente-se um minuto em posição de ser photographado annunciando-se pela campanha electrica».Paterson achou muito original tudo aquillo, mas satisfez as exigencias e annunciou-se.
Abriu-se de prompto uma das portas que davam para o interior da casa e appareceu o dono do hotel. Parecia que o espiavam.
Pela figura viu Paterson que era um estrangeiro: não tinha o porte, a estatura, o facies dos naturaes que até então tinha visto. Saudaram-se em inglez. Paterson, trocadas as primeiras palavras, pensou falar com um conterraneo. Não era, nascera na Inglaterra.
Não houve o abraço apertado do latino, mas o energico aperto de mão do inglez.
Paterson, guiado pelo hoteleiro, entrou para o interior da casa, atravessando os compartimentos maravilhado pela ordem, pelo aceio de tudo.
A luz entrava por toda a parte e o ar circulava em todas as direcções. Respirava-se uma atmosphera leve, impregnada daquelle perfume todo especial, que se desprende das cousas bem tratadas e limpas. Jarros de flores alegravam as salas. Nos peitoris das janellas enredavam-se trepadeiras numa irama verdoenga, salpicada de pequeninas corollas multicores e cheirosas.
Via-se a hygiene pontificando em todos os cantos. Si em um hotel havia tanto culto á saude, imagine-se nos domicílios! E todos esses preceitos eram observados espontaneamente, sem a fiscalisação dos poderes publicos.
Paterson foi agasalhado no quarto n. 50, esplendido compartimento com duas janellas para o jardim, as quaes o arejavam e illuminavam fartamente. As paredes pareciam envernizadas, tal o polimento da argamaça amarello desmaiado.
No canto, uma banca com um jarro de bellas e perfumosas flores. Uma commoda, uma secretaria com seus pertences, um guarda roupa, cabides, cadeiras, uma estante com livros e um leito coberto de alvos lençóes de linho completavam o mobiliario. N’uma das paredes um apparelho telephonico. No fundo do quarto um lavatorio de marmore com seus pertences aos lados, duas estreitas portas, uma que dava para o banheiro e outra para uma sentina, que impressionava não só pelo systema como pelo aceio.
No pequeno quarto sentia-se a mesma atmosphera leve de toda a casa.
A’s onze horas precisamente soou o telephone. Paterson ia levantar-se para chegar ao apparelho, quando deste lhe disseram, em voz bastante clara, que estava servido o almoço. Ficou perplexo. Este povo, não havia duvida, andava na frente de todos os outros.
Minutos depois, estava na sala das refeições. Sentaram-se á meza redonda seis hospedes, estrangeiros quasi todos. Não sabia Paterson o que mais admirar, si a baixella de prata, si o serviço de porcellana, fabricação de Kiato.
Foram servidos diversos pratos: ovos, legumes, hortaliças, peixe, fructas e doces. Não se serviu chá, nem café.
Depois do almoço, Paterson sahiu. O viver original daquella gente, os seus habitos e costumes interessaram-no extraordinariamente.
As horas escoavam-se de surpreza em surpreza.
Aonde iria? pensou.
Um bonde electrico passava. Tomou-o. O carro era luxuoso, os assentos os mais commodos que se podiam imaginar.
Logo que se sentou, o conductor, um homem de fina educação, apresentou-lhe uma bolsa para a esportula, grande ou pequena, conforme quizesse. Poderia tambem deixar de fazel-o, visto ser um tributo facultativo, — disse-lhe em inglez o encarregado do vehiculo.
Paterson, surprehendido com semelhante systema de cobrança, deixou cahir dentro da bolsa uma pequena moeda.
O carro vinha cheio, somente de homens. O americano, que tudo observava, viu que dentre os passageiros não houvera um só que se recusasse a dar a esportula.
— Que terra! que povo... dizia comsigo.
Depois de um passeio de alguns kilometros voltou para o hotel. A parte da cidade que atravessava era outra: as casas de construcção leve, elegante, cercadas de jardins.
Onde seria o bairro dos pobres, dos operarios?
Seria possivel que naquella cidade todos fossem abastados?
Observando com mais attenção as vivendas, notou a differença entre a casa do pobre e a do rico. A d’aquelle era menor, de fachada simples e, em vez de jardins, era cercada de canteiros de hortaliças; apenas um, em frente á casa, e este mesmo pequeno, exhibia flores, roseiras e tulipas.
Poucos eram os transeuntes. Era a hora do trabalho e as gentes da cidade deviam estar nas fabricas e nas officinas. Ouvia-se aqui, ali a chiadeira das machinas, o zum-zum dos teares, o ruido das roldanas, o sibilar das polias, o attrito das engrenagens, fundindo-se todos estes ruidos numsom unico, grave, rouco, que se espalhara pelas cercanias das fabricas, das officinas.
Paterson ia a passo lento, saboreando com o fino tacto de seu espirito culto o delicioso viver daquella gente.
Chegou ao hotel quasi á hora de jantar.
Feita a refeição, conversou algum tempo e ás 7 horas da noite sahiu para vêr a vida da cidade quando se acabava o dia.
Na rua, sentiu a impressão de estar em um reino encantado.
As lampadas electricas scintillavam por toda a parte, com claridade tal que se liam á distancia os cartazes, appensos ás paredes, em letras miudas.
Os jardins publicos, que eram inumeros, começavam a encher-se de gente. Parecia que toda a população da cidade deixava as casas e vinha espairecer nos logradouros publicos, divertir-se nos cinemas e theatros.
De todos os lados vinham symphonias. As musicas eram alegres, consoante a alma daquella gente.
Paterson entrou num dos jardins para ver como se portavam ali os visitantes. Ficou maravilhado. Os bancos estavam repletos. Cavalheiros e senhoras passeavam pelas alamedas conversando. Que cordialidade e que maneiras fidalgas! Senhoras casadas e solteiras riam e palestravam com guapos mancebos, sem derriços, nem coquettismo.
Sahiu e entrou num cinema. Que optima impressão teve! Nunca vira uma disposição tão sabia, aliando o util ao adoravel. O salão era espaçoso. Tão bem dispostas eram as communicações do ar de fóra com o ambiente da sala, tão bem collocados os ventiladores, que, embora o calor reinante, sentia-se uma aragem fresca, e não a quentura, o afogadiço de atmosphera confinada.
O serviço technico era o que de perfeito podia desejar-se.
Paterson, que queria avaliar a moral daquella gente pelas fitas que se iam exhibir, teve agradavel surpreza. Nunca vira cousa egual. Todas as scenas, todos os episodios tinham um unico fim: — «fortalecer e levantar o espirito na pratica do bem».
Reviviam aquelles lances a vida do povo, a sua educação civica e domestica. Nem uma passagem naquelles dramas humanos falava do crime, ensinando ou incitando a commettel-o. A maldade era execrada, não se descrevendo, porém, os seus multiplos modos de agir...
O alcool, como o maior factor das desgraças do genero humano, era a materia dos dramas.
Um destes agradou-o bastante. Era no tempo da decadencia. Um operario casado, com filhos, arrastava uma vida de miserias, embriagando-se diariamente. A’ tarde, sahindo da fabrica, entrava na taverna e ahi ficava até tarde da noite quando se recolhia, bebado, á casa.
O pequeno jornal era quasi todo gasto com o alcool...
A familia soffria privações. A mulher e filhos viviam semi-nus e mal alimentados. Aquelle lar era triste com todo o desconforto da morada do vicio.
Desappareceram um dia as bebidas alcoolicas por um golpe de Estado de uma energia quasi sobrehumana. Não foi, porém, creando pesados impostos, sobre bebidas alcoolicas, mas prohibindo a sua fabricação.
O tempo passa e naquella habitação, onde até então só se ouvira gemer e praguejar, raia a alvorada de uma nova era. Já ha sorrisos com o renascimento da esperança de melhores dias.
O chefe da familia regenera-se, ou antes não bebe mais porque não tem o que nem onde beber. A sua vida normalisa-se, da fabrica para casa. A fome e a nudez desapparecem do lar. Estão salvas as victimas do alcool.
A sessão cinematographica terminou ás 9 horas e 45 minutos. Ao soarem as dez, entrava Paterson no hotel, precisamente quando os sinos de todas as igrejas badalavam, precisamente seis vezes, o toque de «recolher».
Mal foi ouvido o signal, e a grande capital recolheu-se para dormir.
Desertos ficaram os parques. A guarda urbana, que devia, áquella hora, percorrer a cidade, tinha sido extincta, havia muitos annos por desnecessaria. O cidadão de Kiato, cumprindo religiosamente os seus deveres, respeitando os direitos dos outros, não precisava que a força publica velasse pela cidade.
Esta obra entrou em domínio público no contexto da Lei 5988/1973, Art. 42, que esteve vigente até junho de 1998.
Caso seja uma obra publicada pela primeira vez entre 1929 e 1977 certamente não estará em domínio público nos Estados Unidos da América.